quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Porque o indigesto às vezes é necessário

Foto divulgação "Cia Teatro de Riscos"
O XXIV Festival Estudantil de Teatro do Estado de São Paulo apresentou nesta quinta-feira o último espetáculo da modalidade “Escola de Teatro” e a Universidade Barão de Mauá de Ribeirão Preto apresentou “HORÁCIO” de um dos grandes herdeiros que atualiza as propostas de Brechet, que sintetiza as principais correntes do teatro Contemporâneo, questionador da história, da revolução e do homem, Heiner Müller que a primeira vista causa estranheza.

E o palco do Teatro Procópio Ferreira de Tatuí apresentou a concepção de Carlos Canhameiro, diretor do espetáculo, a estranha montagem que utilizava de elementos significativos bem utilizados aos estudantes de teatro que como “jogadores” respeitam a estética de Müller.

Müller em seu jogo estabelece aos atores que não há saídas de cena. “Quem disse o seu texto e jogou o seu Jogo volta para a posição inicial, ou seja, troca de papel... Após cada morte, um dos jogadores deixa cair um pano vermelho”, na montagem de Canhameiro o pano vermelho foi substituído pelo vinho engarrafado que foi jorrado aos litros no palco, causando em uns o entusiasmo pela didática de Müller, em outros a não necessidade de tanta regurgitação com ovos, melancia, frango, farinha e vinho, emporcalhando o palco, e, causando em outros o asco pela ação desenvolvida na encenação, asco que sentimos ao ver nossos semelhantes se matando numa guerra, concepção que pude captar da encenação dos alunos da Universidade Barão de Mauá.

No Jogo de Müller o papel do Horácio após seu assassinato sugere-se sua substituição por um boneco de dimensões imensas, na encenação da “CIA TEATRO DE RISCOS” Horácio é despido, permanecendo nú, depois de Horácio ser o Herói de Roma vencendo a guerra contra Alba e ser o fratricida de sua irmã que diz ser mais apaixonada pelo noivo, morto pelas mãos de seu irmão. No impasse entre as comemorações de sua vitória e o assassinato de sua irmã, Roma dividiu-se entre o herói, onde “sua culpa apaga seu mérito” e o assassino onde seu “seu mérito apaga sua culpa”.

Na didática de Müller seria inconcebível o slogan “rouba, mas faz” e na encenação da Cia de Ribeirão Preto a narrativa não perde a eficácia proposta pelo dramaturgo.

“O estilo do dramaturgo foge a todas as convenções da peça “bem-feita” tradicional, recusando os conhecidos mandamentos do realismo”, e isso estava claríssimo na encenação que esta noite foi apresentada no Teatro do Conservatório de Tatuí e melhor ainda é ver que o estudo de formas e conteúdos desta Unidade de Ensino Superior acentua o radicalismo de Müller ao repudio ao Teatro Digestivo, apesar de gostar de ver particularmente não é a praia que sei surfar ou que anseio.

Estudar teatro é saber respeitar todas as formas de atuação e num Festival de Teatro essa forma indigesta, pode causar questionamentos, mas, quando bem realizada, como foi o caso da Cia, é um acréscimo ao estudante que deve conhecer todas as estéticas existentes na forma de se conceber um espetáculo, mas que tenham ciência, esse é um tipo de espetáculo para determinado público e não é um espetáculo que tem como vocação a formação de público.
As citações acima foram extraídas do livro "O Texto no Teatro" de Sábato Magaldi - série estudos editora Perspectiva

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